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Seguir influenciador que divulga rifa e “tigrinho” fortalece rede criminosa – Por Camila Moreira

Imagem: Reprodução

A prisão recorrente dos chamados influenciadores digitais por suspeita de lavagem de dinheiro através da promoção de rifas ilegais com resultados manipulados para beneficiar membros de organizações criminosas parece ter caído na rotina do noticiário brasileiro. Quando não são os rifeiros, são os garotos-propaganda do “tigrinho” que enganam os seguidores ao apresentar ganhos que não existem através de conta teste para incentivar pessoas a acessarem plataformas de cassino online. É uma equação simples com somente dois resultados possíveis: O influenciador ganha ou você perde!

Não há mais dúvidas de que os influenciadores de tigrinho e rifeiros que ainda não foram presos, serão ou deveriam ser. Ainda assim, eles permanecem ganhando fama e seguidores, mesmo diante da ampla divulgação sobre os crimes que cometem. A necessidade do público de acompanhar vidas superficiais rodeadas de luxo parece tornar a existência desses falsos personagens mais importante do que o caráter de suas ações e, por consequência, os prejuízos que elas provocam.

Ao fomentar o vício, espalhar mentiras para manipular resultados de jogos, auxiliar na lavagem de dinheiro ou obter lucro em cima das perdas de jogadores, estas pessoas cooperam diretamente para o aumento da criminalidade de modo geral e com a piora das condições de vida de quem influencia. Acontece que, o engajamento (visualizações, curtidas e compartilhamentos de conteúdo) de pessoas comuns que dizem repudiar tais práticas ao vê-las do noticiário policial também contribui para isso, afinal, sem público os tais influenciadores não teriam alcance suficiente para continuar enganando pessoas em troca de valores milionários. Se você segue influenciadores digitais que adotam tais práticas, também é parte da encenação que utiliza práticas criminosas para enriquecimento ilícito.

Classificados como contravenções penais no Brasil desde 1946, os cassinos, jogos de azar e bingos estão em discussão há décadas na tentativa de legalização. Na prática, os jogos que são proibidos nos espaços físicos, continuam a movimentar fortunas e seguem em franca expansão, principalmente agora, após a liberação de diversas modalidades online. No fim de 2024, ano em que o Banco Central estimou os gastos de brasileiros com jogos online em cerca de 20 bilhões de reais, o governo sancionou uma lei que regulamenta as apostas online no Brasil. A regulamentação traz uma série de regras para que essas empresas possam operar no país e estipula pagamento de impostos, o que até então não ocorria.

O caso das rifas é diferente. O Ministério da Fazenda não proíbe a realização de sorteios, desde que estes sejam feitos por entidades beneficentes que são enquadradas nas chamadas “operações filantrópicas” e atendem a requisitos rígidos em relação à transparência e destinação adequada dos recursos arrecadados para instituições específicas. É bem verdade que não há fiscalização suficiente para coibir a prática, mas continua sendo ilegal. O influenciador que usa da sua visibilidade pública para sortear dinheiro ou prêmios por meios de esquema de rifa deveria saber – e provavelmente sabe – que está cometendo um crime, assim como aqueles que divulgam falsas propagandas de ganhos inexistentes. No entanto, parece ser mais interessante para eles se apoiar na impunidade e desfrutar de uma vida de luxo às custas dos que vão entregar o que não têm para satisfazer um vício ou o desejo de adquirir bens e dinheiro de forma fácil e rápida.

O fascínio pela ostentação e riqueza inalcançável para a maioria não é um fenômeno novo, mas o avanço das tecnologias digitais e o uso desenfreado das mídias sociais fizeram emergir uma série de personagens que dissimulam uma vida de aparências capaz de enganar qualquer pessoa comum, desesperada pela chance de tirar a sorte grande com pouco esforço, assim como encenado por eles. Está tudo ali no celular, ao alcance das mãos. O que começa como um desejo banal ou simples distração, pode desencadear prejuízos irreparáveis. Pesquisa realizada pela Universidade de São Paulo (USP) estima que, oficialmente, pelo menos 2 milhões de pessoas são viciadas em jogos no país. Esse número deve aumentar consideravelmente com a propaganda maciça dos jogos online que utilizam pessoas cada vez mais influentes.

Mesmo famosos que teriam enriquecido por outros meios e já acumulavam milhões de seguidores anteriormente, têm se utilizado da publicidade de plataformas online para multiplicar suas fortunas às custas de divulgação de jogos viciantes feitos para beneficiar somente seus donos, o que torna os divulgadores tão irresponsáveis, farsantes e antiéticos quanto as organizações criminosas que estão financiando. A mãe que utiliza seus três belos e ricos filhos para te hipnotizar enquanto assina o “cachê da desgraça alheia” para receber 30% do que você perde na plataforma de jogos online que ela divulga – como apontou a reportagem da Revista Piauí -, não está preocupada com o desenvolvimento dos filhos alheios. Pelo contrário, é em detrimento destes que ela favorece os dela. Nesse jogo criminoso de conveniência, cabe a cada um decidir qual conduta vale a pena realmente seguir nas redes e na vida.

Camila Moreira é jornalista formada pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e Doutora em Estudos Étnicos e Africanos pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).