Passadas quase duas décadas desde o assassinato do casal Manfred e Marísia, o caso Von Richthofen continua sendo destaque nos noticiários. Desta vez, Daniel Cravinhos optou por tornar público um recado para Andreas, o irmão de Suzane, que na época do crime tinha apenas 15 anos. Através de uma carta divulgada pelo jornal O Globo, ele expressa seu pedido de desculpas e sua vontade de se reaproximar do rapaz.
Recentemente, o homicídio do casal Von Richthofen, perpetrado pela própria filha, voltou à tona na mídia após o sucesso da trilogia “A Menina que Matou meus Pais”, da Prime Video. Os filmes, estrelados por Carla Diaz e Leonardo Bittencourt, narram a história através das perspectivas dos personagens principais envolvidos no crime.
À parte da ficção, a dolorosa realidade que chocou o Brasil deixou cicatrizes ainda mais profundas naqueles que não tinham culpa ou envolvimento no crime, mas que foram diretamente afetados pelo duplo assassinato. Desde que os pais foram mortos pelos irmãos Cravinhos a mando da irmã, Andreas tem vivido uma vida repleta de desafios, optando por se manter recluso e distante da mídia.
É justamente para ele que Daniel dirige suas desculpas através de uma carta aberta. Cumprindo uma pena de 39 anos de prisão pelo homicídio de Manfred Von Richthofen, ele expressou o desejo de se reconciliar com o ex-cunhado, agora com 36 anos de idade.
Os dois são vizinhos
Para o O Globo, o ex-namorado de Suzane Von Richthofen compartilhou que mantinha uma relação de amizade com Andreas antes do trágico evento e que, por essa razão, frequentemente considera uma reaproximação com o rapaz. Além disso, ele revelou que os dois residem muito próximos um do outro.
“Somos vizinhos em São Roque. Meu sítio fica a três quilômetros do seu. Sinto vontade de tocar a sua campainha, mas temo sua reação”, escreveu Daniel na carta. Hoje, Andreas vive em um sítio a 450 quilômetros de São Paulo.
O assassino de Manfred teme que a presença dele possa causar desconforto ou até mesmo uma sensação de ameaça para o filho da vítima. De acordo com suas declarações, Andreas teria registrado um boletim de ocorrência quando Suzane tentou encontrá-lo anteriormente. Daniel está consciente de que, se o irmão de Suzane decidir denunciá-lo, poderia ser forçado a retornar à prisão. Desde 2017, ele está cumprindo sua pena em regime aberto. Por outro lado, o irmão de Cristian Cravinhos só estará livre da condenação em 2041.
Difícil tentativa de reaproximação
Apesar do receio, Daniel admite que já tentou falar com Andreas. Um amigo em comum intermediou uma primeira conversa, que acabou não se desenvolvendo. Isso porque o irmão de Suzane teria ficado abalado só de ouvir a voz do assassino de seu pai no telefone.
“Gostaria de conversar contigo e expressar meus sentimentos, mas compreenderei se preferires não olhar na minha cara”, afirma Daniel na carta. Mais uma vez, ele pede no desabafo: “Se você permitir, gostaria de ter a oportunidade de falar pessoalmente, olhos nos olhos, e abrir meu coração.”
Antes das tentativas de contato por parte de Daniel, Andreas já havia buscado sua irmã para uma conversa. Em 2017, ele combinou um jantar com Suzane por meio de mensagens, porém o encontro não se concretizou. Durante o trajeto até a casa dela, em Angatuba, São Paulo, o caçula dos Von Richthofen optou por retornar para casa.
Na mesma semana, Andreas foi avistado desorientado pelas ruas do bairro Chácara Monte Alegre, na Zona Sul de São Paulo. Após pular o muro de uma residência e ser abordado por policiais, ele foi encaminhado para uma clínica de tratamento contra a dependência química.
Na carta endereçada a ele, Daniel compartilha sobre as dificuldades que enfrentou desde o crime e ressalta as consequências que suas ações causaram na vida de Andreas.
“É com toda a sinceridade e humildade que peço tua misericórdia. Estou disposto a enfrentar as consequências de meus atos e a fazer tudo o que estiver ao meu alcance para tentar reparar o dano que lhe causei”, argumenta.
Leia a carta na íntegra
“Querido Andreas,
Após sete anos de reflexão, finalmente encontro coragem para escrever a você. Sinto-me apreensivo com a sua possível reação ao ler essa carta. Recentemente, tomei conhecimento de notícias suas por meio de amigos em comum e pela imprensa, o que me levou a tomar a decisão de pôr para fora o que estou sentindo.
Minha mente está em turbilhão, pois meu desejo mais profundo é ter o seu perdão. As palavras mal conseguem expressar a intensidade de minha angústia e remorso. Minhas mãos tremem enquanto escrevo, e cada linha é uma batalha contra os fantasmas do passado.
Há duas décadas, desde aquele fatídico dia, carrego o peso do arrependimento e da culpa, ciente de que minhas ações trouxeram tamanha tragédia para nossas vidas. Desde sempre penso em você, a maior vítima de tudo o que aconteceu. Hoje, ao praticar motovelocidade, a imagem do seu rosto vem à minha mente. Como seria bom ter você ao meu lado, correndo em uma moto. Lembra do mobilete que construímos juntos?
Somos vizinhos em São Roque. Meu sítio fica a três quilômetros do seu. Sinto vontade de tocar a sua campainha, mas temo sua reação. Morro de medo que você se sinta ameaçado com a minha presença. Além disso, sei que a sociedade me vê unicamente como o assassino de seu pai. E você? Como você me enxerga além disso?
Saí da prisão em 2017 após perder 17 anos de minha liberdade. Mas você perdeu muito mais do que eu. Desejo compreender seu luto e fazer parte dele. Lembro do dia da reprodução simulada feita na sua casa duas semanas após o crime, quando você abraçou o Cristian e me olhou emocionado. Quando íamos nos abraçar, os policiais não deixaram. Entendi o seu gesto de carinho como um perdão. Contudo, você era apenas um adolescente. Hoje, você é um homem adulto. Gostaria de conversar contigo e expressar meus sentimentos.
Desde que saí da prisão, reconstruí minha vida, assim como Suzane, sua irmã. Aos trancos e barrancos, o Cristian também está tentando recomeçar. No entanto, a culpa continua a me perturbar. Parte de minha família me rejeita, e sinto que um dedo acusador aponta para mim constantemente, me lembrando do que fiz. Essa culpa não desaparecerá com a sentença que me condenou a 39 anos. Seguirá comigo até o fim dos meus dias.
Espero, do fundo de minha alma, que você encontre no coração a compaixão para me perdoar. Sei que minhas palavras podem parecer insuficientes diante da magnitude do que aconteceu, mas é com toda a sinceridade e humildade que peço por tua misericórdia. Estou disposto a enfrentar as consequências de meus atos e a fazer tudo o que estiver ao meu alcance para tentar reparar o enorme dano que lhe causei. Se você permitir, gostaria de ter a oportunidade de falar pessoalmente, olhos nos olhos, e abrir meu coração.”