Após receber a faixa presidencial, o novo líder da Argentina, Javier Milei, dirigiu-se a milhares de apoiadores em frente ao Congresso para fazer seu primeiro discurso no comando da nação. Em tom apoteótico, o ultraliberal disse que este domingo (10) inaugura uma nova era no país e comparou sua eleição à queda do muro de Berlim.
“Os argentinos expressaram uma vontade de mudança que já não tem retorno”, afirmou, em um discurso repleto de interrupções por aplausos dos apoiadores, que agitavam bandeiras em frente à escadaria do prédio do Legislativo. “Hoje começa uma nova era na Argentina. Hoje declaramos o fim de uma longa e triste história de decadência e e começamos o caminho da reconstrução de nosso país.”
Responsável por derrotar o peronismo no segundo turno há menos de um mês, o ultraliberal começou seu discurso reverenciando a Geração de 37, como ficaram conhecidos pensadores que, diz ele, são uma inspiração, como o intelectual Juan Bautista Alberdi.
De “farol de luz do Ocidente” no início do século 20, a Argentina “abraçou as ideias empobrecedoras do coletivismo”, afirmou o novo presidente, recorrendo ao saudosismo da população em relação aos tempos de bonança, em contraste com a persistente crise econômica que abriu os caminhos para a sua vitória.
Após fazer esse breve apanhado da história do país, Milei criticou as escolhas políticas e econômicas das últimas décadas, em um ataque ao que chamou durante a sua campanha de “casta”.
Apesar da manutenção da retórica agressiva, Milei já incorporou ao seu governo parte das figuras que foram seu alvo nos últimos anos. Neste domingo, o ultraliberal escolheu o ex-presidente Mauricio Macri como o primeiro a ser cumprimentado após receber a faixa presidencial e apertar a mão do agora ex-líder da Argentina, Alberto Fernández, e sua vice, Cristina Kirchner.
“Durante mais de 100 anos, os políticos insistiram em defender um modelo que só gera pobreza, estagnação e miséria. (…) Um modelo que considera que a tarefa do político é gerir a vida dos indivíduos em todas as áreas e esferas possíveis”, disse o anarcocapitalista. “Assim como a queda do muro de Berlim marcou o final de uma época trágica para o mundo, estas eleições marcaram um ponto de ruptura na nossa história.”
Em seguida, o presidente discorreu sobre suas controversas propostas na área da economia —um tema sensível para o país em crise— em um tom de justificativa. “Nenhum governo recebeu uma herança pior que a que nós estamos recebendo”, afirmou, antes de enfileirar dados da economia do país, como o déficit fiscal e a inflação, e explicar o seu plano “motosserra”, como ficou conhecido.
“Não existe solução viável e que evite o ataque ao déficit fiscal”, afirmou, prometendo poupar o setor privado sacrificar a máquina pública. De saída, Milei também rejeitou eventuais reivindicações por uma implementação gradual de suas medidas na economia —”todos os programas gradualistas terminaram mal”, argumenta ele, e precisaram de financiamento, algo a que a Argentina não poderia recorrer.
“Lamentavelmente, tenho que dizer a vocês que não há dinheiro”, afirmou ele, recorrendo a sua nova frase de efeito que, no momento do discurso, estampava camisetas vendidas por ambulantes nas ruas. “Por isso, a conclusão é que não há alternativa ao ajuste e ao choque. Naturalmente, isso impactará de modo negativo sobre o nível de atividade, emprego, salário real e quantidade de pobres.”
“Após a reacomodação (…), a situação começará a melhorar. Haverá luz no fim do túnel. No caso alternativo, a sentimental proposta populista, cuja única fonte de financiamento é a emissão de dinheiro, causará uma hiperinflação que levará o país à pior crise de sua história, além de nos colocar em uma espiral decadente que nos aproximará à Venezuela de Chávez e Maduro”, disse Milei.
“Cem dias de fracasso não se desfazem em um dia, mas um dia começa. E hoje é esse dia. Hoje começamos a sair do caminho da decadência e começarmos a traçar o caminho da prosperidade”, continuou.
O anarcocapitalista encerrou o seu discurso gritando “viva la libertad, carajo” —frase que virou sua marca e que ele usou para assinar os livros de honrarias do Congresso, antes de receber a faixa e o bastão do agora ex-presidente Alberto Fernández durante a cerimônia de posse.